Textos veiculados na lista "Amigos de Blocos" em
agosto de 2001
As contradições de São Paulo
São Paulo amanhece. Outro dia tem início na madrugada
quando aquelas famílias de operários se levantam
às três horas para preparar o almoço. Deverão
sair às quatro horas, pois as dificuldades de locomoção
são enormes.
Quando tudo corre bem, isto é, não existe greve
de qualquer natureza, metroviários, motoristas de ônibus,
trens ou outros transtornos sociais,essas famílias necessitam
de três a quatro conduções para chegar ao
emprego.
Se houver chuvas, alagamentos, desbarrancamentos de encostas,
pontes interditadas por falta de segurança, quedas de postes
etc., então as vidas dessas famílias ficam mais
complicadas ainda. Muitas vezes não conseguem chegar ao
emprego.
Quando chegam, normalmente entram na rotina do dia, após
a marcação dos cartões nas entradas das fábricas.
Cumprem a sua tarefa diária, suportando muitas vezes um
supervisor de área ou produção mal educado
e nervoso, porque a produção não vai indo
bem ou por outro motivo qualquer.
À tarde, escutam a sirene da fábrica. O trabalho
está encerrado. Os operários buscam o caminho de
casa. Os empregados estão exaustos. A pressão psicológica
em manter esse emprego, é muito grande, além de
absorver os problemas que porventura tenham deixado em casa, como:
doença de filho ou esposa, falta de dinheiro, dívidas
a serem pagas e quase sempre não as são, filhos
em escolas distantes e em ambiente perigoso, além de outros
problemas que podem surgir no cotidiano de um operário.
O operário reza para que nada interfira na sua volta para
casa e que ao chegar lá, tudo esteja em ordem. Choveu durante
o dia. O pobre operário já sabe que a ladainha vai
ser mais cruel ainda. O trânsito engarrafado nas principais
vias de acesso. Tudo fluindo com muita morosidade. Os ônibus
superlotados, os trens e os metrôs trafegando com muita
dificuldade. Nem para o relógio o operário olha
mais. Já sabe que tudo está difícil e só
resta pedir a Deus para que nada mais o atinja. Jantar, nem pensa.
Quando chegar, certamente nem a família vai ver, pois já
será muito tarde.
Contradizendo a essa calamitosa situação, São
Paulo apresenta um outro panorama. Executivos de alto nível
não utilizam mais as vias urbanas. Fazem uso de seus possantes
helicópteros,que pousam nas próprias indústrias,
chegam mais tarde, vão ler os jornais do dia que já
se encontram em suas mesas de trabalho, verificam o andamento
das Bolsas do Rio e São Paulo, o índice Dow Jones,
o índice Nasdaq, a bolsa de Tóquio, etc. sempre
saboreando um gostoso cafezinho que o seu empregado já
lhe serviu.
Outros executivos retornam a seus lares, em seus veículos
com ar condicionado, músicas em CD, encontrando trânsito
congestionado em determinadas vias, porém, sempre aparecem
opções ou vias alternativas que o permitem chegar
mais cedo no aconchego de seus lares.
Este é um breve retrato da maior metrópole do Brasil,coração
financeiro e econômico que sustenta a nossa balança
comercial e ainda é o foco do emprego e da instabilidade,
pois lá, ninguém sabe o que acontecerá no
dia seguinte. É a cidade das contradições.
Alberto Metello Neves
|