Amores em metonímia

I)

Trocaste meu continente
por outro conteúdo.
De longe encenas adeus
e, tomada de sofrimento agudo,
nesse aceno sem nexo
coloco um acento
perplexo

Fomos autores de sonhos tantos
e hoje enxugo sozinha o meu pranto;
enquanto trocas de co-autoria e de obra
e dentro em mim a saudade me sobra.

II)

Continente de ti
Em teu universo me perco
a cada vez que te busco.
Solitária entre rochas e musgos
o coração afoga-se em mágoa
na praia bravia de tuas águas.
Aflita, dividida entre corpo e mente
busco teu continente.

Teu corpo sempre tão perto
contrapõe-se à longínqua ilha do teu coração.
Teu amor, uma vã ilusão!
Teu peito, um caudal fugidio e incerto.
Já tendo a garganta seca e o coração mudo,
busco teu conteúdo,
não o encontro e, entrementes
só, permaneço teu continente.

Finalmente, desiludida de amor tão pouco
a garganta presa, o grito rouco
de teus amores deserto.

Esther Torinho