Enfim alguém fala...

          Há poucos dias lamentando o que está se passando no país, comentava que o Brasil carecia de líderes. Alguém com visão aguçada, inteligência profunda, coragem irrefreável e carisma incontestável. E principalmente com boa fé e ideal suficiente para ter persistência nessa missão.  Estava desiludida, sem esperança de ver alguém destemido o suficiente  e capaz de independentemente de qualquer coisa dizer o que nossos dirigentes precisam ouvir.

          Os homens públicos brigam demais, discutem demais, descentralizam os problemas daquilo que é mais necessário e urgente, talvez justamente para disfarçarem o transtorno desesperador de nosso país, ameaçam para não serem criticados, usando uma forma lamentável para uma gente tão sofrida como a desse país.- Vamos demitir, vamos cortar a luz, vamos conter a economia, vamos privatizar..- É isso sempre que sabem dizer e transmitir para o povo já tão oprimido. E carecendo de uma palavra confortadora ou pelo menos de alguém que transmita luz mesmo que fugidia! 

          Há dois dias atrás fiquei maravilhada com o discurso do Presidente da OAB Dr. Rubens Approbato homenageando em solenidade no STF o Ministro Marcos Aurélio de Melo que tomava posse como Presidente

           Como seríamos agraciados pela sorte e conforto se tivéssemos alguns homens públicos que possuíssem essa força, audácia e fossem capazes de colocar os interesses da população e da nação antes de qualquer vaidade pessoal.

            Encantada, extasiada, ouvi o Dr. Approbato pronunciar as seguintes palavras:

"Senhor Presidente Ministro MARCO AURÉLIO: 

Vossa Excelência assume a presidência da mais alta Corte de Justiça do país em um momento em que grandes interrogações pairam sobre nossas cabeças. Interrogações de toda a ordem e disparadas em todas as direções. Há tantas incertezas e indagações afloram: teremos condições de superar o crescente quadro de dificuldades que ameaça romper a estabilidade cada vez mais tênue para nossas visões? teremos condições de sustar o processo de ruptura constitucional, que desfila aos nossos olhos pela passarela aviltante das Medidas Provisórias, agora invadindo e negando os direitos fundamentais? teremos condições de assegurar as reformas indispensáveis ao desenvolvimento da ordem política, da ordem jurídica, da ordem econômica e da ordem social? teremos condições de garantir ao país um programa de desenvolvimento auto-sustentável, sério, comprometido com a sociedade?"

            Todo o seu discurso me encheu de orgulho ao verificar que existem homens como o Presidente da OAB, capazes destemidamente e com a presença do presidente da República  reprovar seus atos mesmo sabendo o quanto estava desagradando o poder e seus correligionários. 

             Mesmo depois que outras autoridades o reprovaram ele manteve a posição e confirmou o que havia dito. E começo a refletir que por vezes achamos que ninguém seria capaz de enfrentar uma solenidade dessas e falar, enfrentando o orgulho e autoridade do Presidente tantas vezes relembrada por ele mesmo. Acho que não vi nem a oposição do país ter essa atitude de franco descomprometimento e generosa coragem.

            Não importa o que vai acontecer pela frente, não importa que os representantes do poder do país reprovem o fato do nobre advogado ter aproveitado uma solenidade para falar da política do país. Tinha que haver um momento e acho que foi uma oportunidade bem-vinda. O Brasil não está praticamente em regime de exceção? Não estamos ameaçados de corte de luz mesmo pagando taxas acima do que seria normal? Então porque não uma exceção também a favor do povo, no momento em que o mesmo é assolado por medidas para as quais é impotente?

             Na verdade as medidas provisórias da forma como estão sendo reeditadas e no meu modo de entender, encontram ressonância no autoritarismo velado que domina o país. E quando alguém com capacidade e competência e que preside uma entidade de tal importância é capaz de se insurgir contra isso, é motivo para a admiração plena de toda a população.

Vânia Moreira Diniz