Textos veiculados na lista "Amigos de Blocos" em  novembro de 2001


Potencialidades anuladas

Tenho uma parceria maravilhosa com a natureza. Não posso abrir mão disso porque ela é que me dá forças nas horas de sofrimento e me apóia e compartilha das imensas alegrias do caminho. Não há melhor parceira que essa energia que se desprende da mãe terra, abastecendo-nos com um vigor inacabado.

Nem sempre posso dispor de tempo para me restaurar imediatamente. Mas hoje, achei que nada seria mais importante do que olhar para o horizonte, onde a força horizontal interminável seria necessária e me forneceria elemento imprescindível. Esses dias estão muito difíceis, porque vejo não só a violência do mundo mas a indiferença do nossos julgamentos e da nossa justiça em decisões sobre atos hediondos.

Falo de dois casos, fora tantos outros que não vieram à luz ou não foram considerados diferentes pela nossa mídia. E começo a refletir na tristeza; novamente a mesma triste conclusão de não se respeitar o outro ser humano.

O índio que estava ali dormindo, tranqüilo, sem fazer mal a ninguém, de certa forma confiante e puro, e que foi dominado pelo insano divertimento bárbaro de jovens que não viam nada à sua frente senão o desejo de ridicularizar, mesmo que isso significasse ferir e matar alguém. É isso o grande problema da humanidade: O desinteresse pelo sofrimento de outras pessoas e pior que isso: Além do desinteresse, a agressão.

Não vou me estender sobre o julgamento que já foi muito bem colocado, mas quero pelo menos compreender por que? Precisamos desesperadamente entender o porque desse sadismo que toma conta da humanidade.

Há alguns anos atrás uma moça de 23 anos, Daniela Perez foi morta estupidamente por um assassino frio num ato até hoje enigmático. E agora se procura diminuir cada vez mais sua pena, talvez breve fique fora da condicional e completamente livre.

Os direitos dos que cometeram violência são sempre alardeados por aqueles que defendem os direitos humanos. Quem defenderá os que foram violentados como essa moça, que não está aqui para contar-nos exatamente o que se passou, mas que foi até difamada pelos seus torturadores?

Há pouco tempo uma pessoa que estava passando fome e roubou para comer e saciar a fome de sua família foi imediatamente presa. Fico abismada com a falta de discernimento das autoridades. Não estou conclamando a desordem, mas continuo sem compreender. Foi preso porque era pobre e não tinha quem o defendesse. Se fosse rico, roubar seria cleptomania, uma doença por compulsão.

No dia que todos pudermos nos dar a outro ser humano, entender que o egoísmo e a maldade ofendem primeiramente a nós mesmos antes de qualquer coisa, que a violência é uma anomalia do espírito e uma deformação do interior das pessoas, estaremos começando a nos conscientizar do valor da vida, da importância dos irmãos que caminham conosco, da verdadeira felicidade, das reações as mais espontâneas e legítimas.

Infelizmente o que atualmente presenciamos com horror é o descaso, maldade, violência, fingimento e anulação das potencialidades intrínsecas, nessa agressão dia a dia, e que encontra respaldo na impunidade dos que comprometem os elementos mais preciosos da vida.

Vânia Moreira Diniz

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