Textos veiculados na lista "Amigos de Blocos" em
setembro de 2001
SER VELHO: UM PRIVILÉGIO
O filósofo Sócrates, que nasceu em Atenas em 469
a.C. e morreu na mesma cidade em 399 a.C., se apresentava em debates
como um verdadeiro ignorante, usando o conhecimento que o homem
tem do próprio homem, partindo da premissa que sabia que
nada sabia.
Na verdade isso era apenas uma armadilha, pois Sócrates
era um mestre na utilização da ironia e se o debatedor
se conscientizasse e superasse a raiva da exposição
ao ridículo, conseguia apresentar soluções
lógicas para problemas apresentados, experimentando sensação
de glória intelectual pela experiência vivida. (Os
Pensadores - "Sócrates" - São Paulo -
1987 - Editora Abril)
Talvez o filósofo tivesse consciência que perante
o conhecimento universal, por mais que soubesse, jamais saberia
o suficiente, por isso sabia que nada sabia.
Em que pese, a expressão "saber o suficiente"
só deverá ser usada em relação a algum
problema apresentado, pois a solução se dará
no momento da aplicação do conhecimento específico.
Problema resolvido, utilizado conhecimento suficiente.
A grande questão é: quanto de conhecimento é
suficiente, ao ser velho, morrer sabendo-se feliz?
Se partirmos do conhecimento enquanto herança da própria
vivência da humanidade, como bem definiu Jung, quanto ao
inconsciente coletivo, temos a abstração do próprio
conhecimento até o momento de sua afloração
para o consciente como verdade apresentada.
Chegamos ao mesmo ponto: problema apresentado, solução
encontrada através de conhecimento específico.
Donde se conclui que conhecimento só serve para resolver
problemas apresentados. Ou, para que serve o conhecimento se não
for utilizado para resolver problemas expostos?
Talvez a verdade seja outra: Ser velho e morrer feliz, independe
de maior ou menor conhecimento.
O poeta Manuel Bandeira expressou toda sua angústia num
poema tão singelo e tão universal: "Andorinha
lá fora está dizendo: Passei o dia à toa,
à toa. Andorinha, andorinha, minha cantiga é mais
triste, passei a vida à toa...à toa."
Aqui temos a vivência humana não na solução
de problemas apresentados, mas na riqueza das experiências
vividas, que deixando de tê-las, ensejou o passar a vida
à toa, à toa, por isso a angústia do poeta.
A contrário-senso, uma vida rica em experiências
vividas traz conhecimentos tantos, na mesma proporção.
Isso impõe outra indagação: Um homem ignorante,
com pouco conhecimento universal, mas o suficiente para ter resolvido
de forma satisfatória todos os problemas que surgiram ao
longo de sua vida, foi ou não feliz?
Partindo agora das mesmas questões e juntando-as, podemos
concluir que ao morrer sabendo-se feliz é diferente de
morrer sentindo-se feliz.
O conhecimento mais sábio talvez seja saber, ao fim de
uma vida, que sentir e saber é mais importante que só
sentir, ou só saber.
O pensador só pensa. O emotivo, só sente. O velho
sábio pensa e sente. Um privilegiado.
Ao final da vida, mesmo tendo grande conhecimento e sabendo solucionar
inúmeros problemas, mas tendo humildade o suficiente para
saber que nada sabe, não como ironia, mas como insignificância
perante o universo, o velho sabe, sente e morre feliz.
Douglas Mondo
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