Textos veiculados na lista "Amigos de Blocos" em
setembro de 2001
Humanus
É da natureza humana. Assim falou um humano.
Uma criança nascida em algum lugar, sob qualquer cultura,
na divergência com outra criança continuará
a brincar sem guardar rancor ou pensar em vingança.
Na disputa do objeto, simples como inocência, o interesse
se perde na posse tola, espelho da angelical vivência.
A criança sabe, do alto de sua inteligência, que
o objeto é apenas um brinquedo e o que vale é a
brincadeira, na face verdadeira do sorriso infantil pleno de carência.
Na morte da criança, nasce o adulto cheio de falsa indulgência.
E aquele que prega a benevolência é torturado e morto,
sem qualquer clemência.
No passeio do tempo, sob o sol de longa existência, reza-se
para o Eterno na
praça sob o abençoar da Santíssima Eminência.
E, logo após, aperta-se botões
e luzes cortam a noite a matar irmãos, no estalo da superioridade
e bem-fazer da imperiosa potência.
Archotes de palhas, no estrondo de falsos raios, são os
novos brinquedos da vida adulta a maltratar velhos e crianças,
acertados como alvos fáceis na gloriosa decisão
da alta sapiência.
Ao final, corpos embaciados lembram múmias da antiga civilização
que também
guerreou e da guerra nada levou, a não ser ódio
e tristeza, marca negra da dor no velho coração,
fétido em divergência.
De um lado súditos emirados, na guerra-santa sentiram
seus corpos mutilados e agora lutam por liberdade a seus cultos
sagrados.
As mãos espalmadas do oriente contra o poder do ocidente
que range dentes
loucos como feras a querer matar o leão que se esconde
entre as rochas a maldizer a compaixão.
E este, por sua vez, ataca inocentes perdidos entre papéis
tolos de razão, na busca insensata das férias inacabadas
e prestações vencidas de casas pré-fabricadas,
de concreto-armado ou de folhas de bananeiras vitrificadas.
Não há razão na morte, apenas palavras soltas
cheias de rimas tristes nas bocas tolas de sonhadores poetas,
que vivem belas utopias derramando desejos de verdades e não
de meras fantasias.
Amanhã de manhã haverá carnificina, como
dantes houvera, sob o som da raiva
humana, não da vontade divina.
Virá num lindo carrossel de fogo e trará desesperança
à humanidade, louca para se envolver num sudário
negro como a noite e não no abraço da virgem de
beleza cristalina.
A espada da justiça infinita matará o irmão
e a irmã da inocente menina.
Não restará pedra sobre pedra, nem vida animal
ou vegetal. O calor será tanto que no inferno pensar-se-á
que chegou o juízo final.
A glória dos homens determinará a sentença
final: Viva a guerra-santa! Morte ao homem que nasceu ocidental
ou oriental, é a lei de Deus, é a vontade de Alá.
E a paz que sonhou o poeta, deixe estar. Vou-me embora pra Pasárgada
de braços dados com Manuel Bandeira, pois lá ele
é amigo do rei, já que aqui, amanhã de manhã
não serei feliz e de noite, ao saber das mortes de meus
irmãos, terei vontade de me matar.
Assim caminha a humanidade. Exterminando humanos.
Douglas Mondo
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