Resposta a um amigo triste...
                                                                                           Colares, 18 de Julho de 2000

William,
Claro que tenho tempo. Se não tivesse tempo para você, estaria a negar a nossa amizade. Acho, no entanto, que o texto que me mandou não é significativo de uma realidade. É apenas um estado de espirito. Todos nós perdemos um amigo, quiçá, mais do que um amigo. Alguém bem mais próximo de nós. Eu perdi, você perdeu.
Mas por estranho que pareça, nenhum de nós perdeu nada.
Da mesma forma que a palavra Amigo define o mais alto grau de intimidade possível entre dois seres, independentemente do seu grau de parentesco, também a perda é irreal. Apenas a sua sensação  existe.
Estamos habituados a considerar como Ter –  possuir – a possibilidade de contactarmos apenas através dos sentidos, pelo menos dos  cinco sentidos que nos habituamos a usar na nossa existência do dia a dia.
Mas a verdade, graças a Deus, não é essa.
Quando nos une um sentimento a alguém, seja ele de amor ou de ódio, esse sentimento naturalmente perdurará para sempre. Esse será o laço que nos une e unirá para sempre a alguém. É indestrutível. É imenso. É interminável e infinito. É e será para todo o sempre.
A vida, no entanto, congelou-nos num universo diminuto, tanto em tempo como em espaço.
Não conseguimos e não permitimos que a ideia de uma outra realidade, maior, vasta e eterna, nos assegure a continuidade dos nossos sentimentos pelos outros. Limitados pelos nossos sentidos, quando deixamos de os ver, de os sentir, de os cheirar, de os tocar, consideramos então que tudo acabou, que tudo irremediavelmente acabou e deixamo-nos resvalar para uma noção de perda irreparável. Existiu, não existe mais.
Surge então o sentimento de culpa e o remorso. O que eu não poderia ter feito por ele !
Não é possível conseguimos o perdão se não aprendermos primeiro a perdoarmo-nos a nós próprios.
A verdade é:
Quando amamos alguém, esse amor continuará a existir para sempre. Quando a vida física nos separa, aprimorima-se o sentimento que nos une. A amizade e o amor sublimam-se a dimensões que não nos são dadas a conhecer pelos sentidos. Entra-se no etéreo. Passa-se ao Alpha e ao Omega. Inicia-se o começo. Atingem-se a libertação e a comunhão completas.
O beijo e o abraço que nos demos um dia, estarão gravados no futuro e para sempre. Esta é a realidade. Tudo o resto são limitações que nos impomos.
Também eu penso em você. E pensarei sempre, independentemente da distancia que nos separa. Você existe dentro de min. Os laços que criámos durarão a eternidade. Serão para sempre. Será que você entende agora o que criámos juntos ?
Como podemos despedirmo-nos de um amigo, quando ele parte. Só dizendo ‘até breve’.
Como podemos aconchegar um amigo enquanto ele não parte. Só dizendo ‘ estou aqui’.
Não choro os meus amigos. Choro por min, pela saudade que deixaram, mas guardo no mais fundo do meu ser, a esperança e a fé no nosso próximo reencontro, dizendo:
Amigo, um abraço.
Estou aqui.

José da Cunha Lima


 
 
 

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