"Quando essa batalha se consumou, o Rei Arthur deixou que enterrassem seus mortos. E então o nobre Sir Gawaine foi achado numa embarcação de largas proporções, quase morto. Ao saber que Sir Gawaine encontrara a morte, o Rei Arthur a ele se dirigiu, tomou Sir Gawaine nos seus braços e desfaleceu três vezes" (Sir Thomas Malory, A Morte de Arthur)Leila:
Chove muito. Uma chuva gorda, matemática,
inesperada, mesmo surgindo quase todas as madrugadas. O calor insiste em
não partir com o verão, provocando
um desassossêgo e odores fortes. Eu me sinto distorcido como se estivesse
no mundo
altamente visual de El Greco, mas exatamente
em O ENTERRO DE CONDE D´ORGAZ, que vi com o poeta Esteban
Ramirez Plaza em Toledo, na Igreja de San Tomé.
Passei o dia consultando livros de arte, lembrando pintores, apreciando
minha coleção de imagens de São
Sebastião, que está num álbum de veludo negro. É
que estou pensando em pintar, como
fiz na adolescência. Revi os desenhos de
John Fenniel para ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS, de Lewis Carroll.
Umas figuras alucinadas, como o texto; a natureza
de Henri Rousseau e Gauguin; o belo A MÁQUINA GORJEANTE, de
Paul Klee; Hieronymus Bosch e O JARDIM DAS DELÍCIAS,
que vi no Museu do Prado. Mexi na terra também quando a
chuva permitiu, tirando ervas daninhas, plantando
hortelã e cuidando de um orquídea nativa. Hoje é feriado.
Não faço mais
nada. Sou um dos insetos da minha casa. Minha
mãe e o mano Macelo chegam amanhã para visita de uma semana.
Fico
contente por ser honrado com almas tão
puras. Hoje ainda não toquei em ARTEPALAVRA, mas reservo-o para
logo mais.
Ontem vi dois filmes sensíveis, italianos:
A TRÉGUA, sobre um escritor judeu num campo de concentração,
e JANE EYRE,
de Zefirelli, baseado no clássico de Charlotte
Bronte. Acordei com um arco-íris nas dunas de Ponta Negra. Não
consegui
contar as sete cores. Enquanto a chuva cai penso
em relâmpagos e trovões, ou melhor, relâmpagos sobre
a água. Dizem que
é muito difícil um relâmpago
por aqui, e não me dão uma explicação cientifíca
lógica. As horas passam cheias de mistérios.
Eu converso com árvores. O gigantesco
cajueiro dei o nome de Leon e a imponente castanheira, Graciliano. Chamo
uma
pequena lagartixa, que vive no telhado da sala
de leitura, de Lulu. Eu ando esquecendo muita coisa, mas me conformo pois
nem tudo merece ser lembrado. Será que
um dia esquecerei do meu rosto?! Beijos mil.
Antonio Júnior
E-mail de 1 de maio de2 002