"LETRAS CLÁSSICAS", POR HENRIQUE CAIRUS

Professor Dr., Coordenador do Departamento de Letras Clássicas da UFRJ (Pós-Graduação), ensaísta, poeta, co-editor de CALÍOPE: Presença Clássica, revista do Programa de Pós-Graduação em Letras Clássicas e do Dep. de Letras Clássicas da UFRJ. Na Internet, veicula a lista: PGclassicas - Pós-Graduação em Letras Clássicas - UFRJ e tem site pessoal: http://www.geocities.com/henriquecairus/

Coluna de nº 19 - 2ª quinzena agosto
(próxima coluna: 04/09)

Carregas o nome da tua carne

Quem quer que estude oficialmente as Letras, há de encontrar pelo caminho disciplinas escolares com o nome de Literatura.
Literatura brasileira, literatura inglesa, grega ou francesa. Lá estará ela, a literatura!
Mas o que se estuda nessas disciplinas?
A literatura, é claro! Mas como a literatura, objeto criado pelo homem, para atender às necessidades e exigências do espírito, vai ser estudada? Que ferramentas o homem criou e que objetivos ele pensou quando decidiu que era preciso estudar esse objeto?
É evidente que o estudo da literatura nasceu em um momento em que se cria na possibilidade de compreensão total de um objeto, embora os didatas perdidos diante de um universo que ninguém nunca conhece, o da arte, tentassem loucamente desvendar algo que nem sabiam o que era. Ainda que soubessem, como todos nós, reconhecê-lo.
Disfarçando sob o ar pernóstico e sob o conhecimento de um anedotário e, no máximo, de um acervo terminológico de retórica e de escansão, esses bravos soldados da luta contra a ignorância distribuíam seu precioso saber desordenado.
Mas ficava, como ficou e fica, a sensação de um percurso impossível rumo ao inefável.
Isso, acredito, porque ainda se continuou a crer na possibilidade de desvendar o dito na língua estética da literatura.
Com o tempo, foi surgindo, sabe-se tão bem..., outras tentativas, as estruturalistas, as hermenêuticas, as filosóficas e as históricas. Todas voltadas para um só sentido, o de tentar salvar a vida do morto: o de tentar, privilegiando um aspecto do possível, torná-lo único ou maior.
Assim pensando, penso também no quanto seria construtivo a postura de estabelecer-se definitivamente nas escolas das Letras o estudo sistemático da história da literatura, por exemplo, que, com o instrumental já bem traçado pela historiografia, pudesse enfrentar os desafios reais dos intertextos e da recepção.
E o mesmo pode-se dizer do que poderia ser chamado de “estética literária”, e de “estruturas efetivas da literatura” (onde ‘efetiva' opõe-se a ‘possível', que seria coisa de autor, e não de estudioso), etc.
Arrastando o nome de sua carne, o estudo da literatura persiste no enfadonho equívoco de não ceder às suas limitações, que o levariam a finalmente declarar-se parcial e menor diante de seu objeto.

 

 


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