"LETRAS CLÁSSICAS", POR HENRIQUE CAIRUS

Professor Dr., Coordenador do Departamento de Letras Clássicas da UFRJ (Pós-Graduação), ensaísta, poeta, co-editor de CALÍOPE: Presença Clássica, revista do Programa de Pós-Graduação em Letras Clássicas e do Dep. de Letras Clássicas da UFRJ. Na Internet, veicula a lista: PGclassicas - Pós-Graduação em Letras Clássicas - UFRJ e tem site pessoal: http://www.geocities.com/henriquecairus/

Coluna de nº 21 - 2ª quinzena setembro
(próxima coluna: 04/10)

Centros culturais

           O Rio de Janeiro, assim como São Paulo, está ampliando suas redes de Centros culturais. Banco do Brasil, Correio, Light, e vários outros menores. Basta andar pelo Centro do Rio. Um casarão bem pintado, simpático, com um segurança despreocupado à porta é uma boa razão para procurar-se uma placa onde se leia: Centro Cultural.
            Quem, querida leitora, poderia achar que isso não é ótimo?
           Bibliotecas, cinemas, teatros e exposições concorrem ali com os atrativos naturais de uma cidade encantada, e trazem a consciência de estar-se no mapa cultural do planeta.
           Nada mais nobre e justo.
           Essa proliferação de centros culturais é evidentemente conseqüência de uma política acertada dos governos, que, pelo menos por isso, merecem todos os elogios.
           Para além de toda a simpatia romântica e autêntica que os centros culturais despertam, seu crescimento leva-nos a inevitáveis reflexões.
           O centro cultural democratiza e viabiliza o acesso a todo tipo de atividade que mereça o título oficial de “cultural”. Não raro, cumpre também a função de formalizar as menifestações artísticas mais espontâneas, que normalmente são assimiladas sob o rótulo de “naïf” ou “regional”. É a apreciação asséptica do “lá” que, assim, se faz “aqui”.
           O valor desses centros é, portanto, inquestionável. De fato, a cultura formal deve ter seu espaço preservado, e seu espaço deve ser reconhecido e, especialmente, deve ser sacralizado, e tal sacralização é inalienável do processo civilizatório.
           Ficam, ainda assim, alguns pontos a serem revistos, como, por exemplo, o simbolismo da localização geográfica desses centros culturais, que ainda excluí os lugares onde eles seriam tão necessários. Ali, os nossos centros culturais são substituídos pelas “lonas culturais”, que se alimentam de migalhas caídas da mesa dos “centros”.
           Outro ponto a ser repensado é o confinamento da cultura a um espaço que, mesmo tentando sacralizá-la, nem sem sempre logra valorizá-la. Uma visita ao centro cultural da Light do Rio de Janeiro, por exemplo, mostra o quão pouco ele interage com a estação de trem da Central do Brasil, sua vizinha.
           Análogos aos “templos de consumo”, os shopping centers, os “templos da cultura formal” parecem ter o poder de transformar o simples transeunte em pedante apreciador (e avaliador) da arte.
           Esperei por algum tempo banalizar-se o hábito de nossa simpática burguesia freqüentar esses centros, com a ilusão de ver esmaecer a afetação com que circulava por esses solos sagrados, mas enquanto isso não acontece, desfruto das vantagens de ver nossa cultura formal voltar a ser deliciosamente cultuada entre nós que reaprendemos, nesses templos, a colocar os sentidos a serviço da sensibilidade.

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