LEILA MÍCCOLIS - A PEQUENA NOTÁVEL
No alto de seus 1,30m de altura, Leila Míccolis
se multiplica, faz poesia, peça de teatro, novela e até música.
Co-autora das novelas Kananga do Japão, Barriga de Aluguel e Mandacaru,
em conversa com a Casa de Arabella, fala sobre a profissão Escritor,
seu trabalho e outras coisas mais. Sempre mais, como convém à
artista, profissional e pessoa que é.
Casa de Arabella - Você escreveu a novela
Barriga de Aluguel com Glória Perez, suas poesias são, de
modo geral, críticas e algumas abordam
temas polêmicos como homossexualismo. Ainda, segundo outros escritores
e leitores, o seu trabalho é
audacioso e cortante. É assim que você se traduz, uma escritora
polêmica?
Leila - Perguntinha difícil esta,
heim??? até porque uma escritora polêmica não se traduz
tão facilmente assim... (risos) Mas, vamos lá. Parece que
você quer saber a minha interpretação de escritora
polemica. Creio que é alguém que, com sua literatura, questiona
os padrões de comportamento com os quais não concorda, instigando
as pessoas a fazerem uma revisão de valores também.
Casa de Arabella - Está relacionado
ao papel social da arte, Como elemento de discussão e conscientização?
Leila - COM CERTEZA!!! Embora tenha muito
prazer no ato de escrever, não
vejo a literatura dissociada do contexto social em que ela se insere.
Casa de Arabella - Seus trabalhos são
muito diversificados, de novela a prosa
e poesia, passando ainda por cinema
e teatro. Como é trabalhar com diversos
tipos de linguagem?
Leila - Fascinante!!! Eu ADORO escrever
e aprender com cada gênero literário. Nesta área eu
gosto da diversificação, porque acho que me expande como
autora, me dá uma maior consciência da amplitude profissional
de eu um escritor e abre mais portas para a veiculação dos
meus trabalhos.
Casa de Arabella - Onde você se sente
mais a vontade?
Leila - Na poesia. A poesia é minha
"menina dos olhos", minha paixão, minha vida, até por ela
ser tão depreciada, tão malquista ainda. Na poesia sou mais
mal-comportada, a transgressão é maior. Ultimamente também
tenho me deliciado com as crônicas que escrevo para a Internet (semanalmente
em "Crônica do Dia" (CE) e quinzenalmente em "Proa da Palavra" (RS).
Gosto do cotidiano, do dia-a-dia que parece tão sem importância
e comum, mas que é tão incrível, a cada gesto.
Casa de Arabella - O que você ainda não
fez? (eu só não encontrei letra de música no teu site).
Leila - Tenho letra de musica também...
de parceria com Tony
Pereira e "O Espirito da Coisa"... risos.
Não sei o que não fiz.
Em termos de literatura, gosto de experimentar
tudo, de correr riscos, de enfrentar desafios.
Casa de Arabella - Percebe-se claramente, através
do seu próprio site, a Leila Míccolis militante, que tem
projetos relacionados ao cinema, cria discussão em torno da profissão
escritor, entre outras coisas. Você vê boas perspectivas para
o desenvolvimento da arte, de modo geral, no Brasil?
Leila - Depende do meu estado de humor e
do grau de dificuldade à minha frente. Às vezes acredito
nelas (nas boas perspectivas), às vezes tenho vontade de sair correndo...
Acho que o Brasil tem um enorme potencial criativo... O problema não
é o desenvolvimento artístico. É o mercado de trabalho.
Sem que a profissão seja legalizada, ele vira feira livre... e nem
isso, porque feira livre tem regras comerciais rentáveis, e uma
tabela de... Nós, nem isso temos.
Casa de Arabella - E o Brasil social e político?
Quais são suas principais impressões?
Leila - Olha, acho que esta pergunta daria
um romance. Mas, tentando ser o mais sucinta possível, sinto falta
da efervescência dos anos 70 -- minha geração poética
-- do "clima" de desobediência civil, da ousadia das propostas, das
discussões maravilhosas sobre política de corpo, da conscientização
dos mecanismos sutis de manipulação. Hoje, Com o peso de
dois golpes castrativos: a ditadura e a AIDS, creio que demos um retrocesso
legal... Mas, como quem cala consente, continuamos soltando o verbo.
Casa de Arabella - Até onde arte e política
se misturam?
Leila - É... ( risos ). Até
hoje a poesia é considerada por muitos não um gênero
literário, mas um gênero confessional, autobiográfico.
Parênteses: pronto, está aí um gênero pelo qual
eu nunca incursionei: a autobiografia... Fecho parênteses. Então,
na cabeça das pessoas, as coisas se misturam muito: vida e ficção.
Temos que ter certo distanciamento -- não só, critico como
também emocional; mas, pessoalmente, acho que vida e arte precisam
ter certa coerência, caminharem pelo menos paralelas, na mesma direção.
Não creio em discursos libertários provindos de autores reacionários.
Pero que los hay los hay...
Casa de Arabella - O seu primeiro livro foi
lançado em 1965, no ano seguinte ao golpe militar. Onde você
estava naquela época? Estava de algum modo presente nas movimentações
estudantis e artísticas que marcaram esse período?
Leila - Participei, a meu modo... Meu tamanho
de "pequena
notável" (1.30 m.) era um perigo para
qualquer movimento
clandestino... risos. Então, nem me
deixavam chegar perto, em nome da segurança... deles. Mas, era impossível
não tomar partido. Eu estudava direito na Faculdade Nacional, a
do CACO... tínhamos policia entrando nas salas a todo momento...
Minha desilusão com o direito começou aí. Fiz toda
a faculdade durante este tenebroso período, em que não havia
leis... ou melhor, as leis eram de exceção. O jeito era entrar
de sola na poesia, o que não era tão tranqüilo assim
porque, quem tinha um mimeógrafo naquela época, podia ser
taxado de subversivo e perseguido (a literatura de mimeógrafo era
como se fosse uma bomba caseira)... Acho que todos nos fizemos o que pudemos
e revidamos com o que tínhamos na mão: paus, pedras ou canetas.
Casa de Arabella - Algum momento em especial?
Leila - Meus poemas eram muito censurados.
Meus amigos
eram muito perseguidos. Nicolas Behr (em Brasília)
teve toda
sua biblioteca de poetas marginais (eu inclusive
e uma penca de gente) confiscada pela policia. Era um clima de terror.
Na época eu escrevia para o Suplemento Literário da Tribuna
da Imprensa e fiz uma matéria que ficou meio famosa no meio poético.
A Tribuna saía com páginas e páginas em branco para
mostrar o papel da censura... Quando o Suplemento fez 7 anos Maria Amélia
Mello me perguntou se eu faria uma matéria falando de tudo isto.
E eu fiz... Enfim, de omissão ninguém pode me acusar.
Casa de Arabella - Existe um senso comum sobre
a juventude daquela época e a de agora. Sobre a juventude que era
revolucionária e queria mudar o mundo e a de hoje, extremamente
individualista e consumista. Você acredita que seja mesmo assim?
Até que ponto?
Leila - Bom, é inegável que
existem grandes diferenças, até
porque as circunstancias históricas
também são diversas. Em
68/70 a gente precisava viver com mais intensidade,
porque
tínhamos consciência de que poderíamos
não estar vivos no dia seguinte. Hoje, não existem fantasmas
tão ameaçadores assim (pelo menos, em tese...). Mas eu não
vejo a juventude de hoje desta forma tão superficial. Acho que,
se há muita gente consumista, também há muita gente
consciente -- como em toda as épocas. Sem duvida, duas décadas
de silêncio criam um grande abismo mas não intransponível.
Afinal, para que serve a construção de pontes?
Casa de Arabella - Sobre a profissão
escritor: o que você acha que falta para o escritor ser encarado
como um profissional?
Leila - Leis... Volto a dizer: sem regulamentação
da profissão,
ela não existe. A lei de direitos autorais
é piada. Escritor não
tem controle da comercialização
de seus textos, principalmente se são de poesia. A maioria acha
que ainda está fazendo grande favor divulgando o autor e sequer
tem a cortesia de pedir autorização para isto. Até
que ponto atitudes como estas homenageiam alguém ou perpetuam arbitrariedades?
Surpresas do gênero não acontecem só no Brasil. Consto
de obras publicadas na Franca, no México, em Portugal e nos Estados
Unidos, sem NUNCA ter dado permissão. Acho isto uma vergonha.
Casa de Arabella - Qual a sua visão
do atual processo de adequação da cultura ao mercado?
Leila - Começam a surgir agora firmas
(principalmente com
poetas no meio) dispostas a captarem recursos
para mega-eventos poéticos -- e a poesia é, de todas as áreas,
a mais difícil de ser "adequada ao mercado", até por ser
a mais irreverente... Inclusive, temos uma série de "recomendações"
contratuais quando participamos de algumas
dessas iniciativas: nada de palavrão, de visões extremistas
ou pessimistas; também nos dão uma lista de temas preferenciais,
etc. etc. etc... Mas, mesmo com todas os cerceamentos, aplausos para esses
incentivadores da poesia, ainda poucos e raros.
Casa de Arabella - Para que ela aconteça,
é preciso ser
vendável/consumível?
Leila - A tendência é esta,
o que é perfeitamente compreensível. Se não for assim,
não haverá interesse mercadológico. Foi exatamente
por purismos ideológicos que a poesia se afastou da realidade, dando
chance a falsos slogans como: "poesia não vende". Agora: "vendável"
e/ou "consumível" não precisa ser sinônimo de "pasteurizada"
ou "servil". Acho que poesia inteligente vende, principalmente quando alia
o humor a uma contestação sagaz.
Casa de Arabella - Como a literatura está
se saindo diante desse quadro?
Leila - Não temos ainda muitos autores
de best-sellers, até porque escritor quer que o sucesso "caia do
céu". Ator leva seu book para todas as pessoas que podem lhe dar
emprego; escritor
(principalmente poeta) sonha que alguém
lhe procure para oferecer uma grande oportunidade, como a publicação
gratuita
de seu livro, com 50.000 de tiragem. Lógico
que vai continuar
esperando... É preciso que a mentalidade
dos escritores mude, individualmente, para que alguma coisa melhore em
termos coletivos.
Casa de Arabella - Em relação
ao crescimento da mídia eletrônica (CD-ROM, Internet, etc),
acredita que ela realmente vai "pegar" para edição e publicação
de obras literárias?
Leila - Acho que são dois mercados
que não competem: a edição virtual e a impressa. Eu
não gosto de ler nenhum texto grande na tela. Me cansa demais. Como
eu, muita gente. Alem do mais, adoro livros, gosto de folhear, escrever
na margem, tenho prazer em mexer com papel. Escrever a mão me delicia
(poesia, principalmente). Então, penso que um meio não inibe
outro, só acrescenta.
Casa de Arabella -. Conhece os livros eletrônicos?
Você teria um?
Leila - Conheço sim, lógico.
Não, não teria. Meu intuito não é
"aparecer" desta maneira. Disponibilizar uma
obra on line é
reduzir muito a possibilidade de vendê-la.
E não tenho a mínima intenção de distribuir
meus livros. Vivo disso, assim como um advogado, um engenheiro ou um medico.
Relembrando Cacilda Becker: "não pecam para eu dar a única
coisa que eu tenho para vender". Alem do mais, minhas ultimas obras tem
sido publicadas pelo nossa Editora (minha e de meu companheiro Urhacy Faustino)
- Editora Blocos - e é muitas vezes com o dinheiro da venda de nossos
livros -- meu e dele -- que financiamos outros projetos culturais. No fundo,
às vezes, pagamos para trabalhar...
Casa de Arabella - Algo que também tem
a ver com profissionalização: acredita que pode-se formar
um escritor?
Leila - Você está falando de
formação profissional? Acho sim.
Muito da técnica pode ser aprendida.
Sou autodidata, nunca
tive professores, mas adoro dar oficinas de
criação e cursos
de roteiro de televisão. Se tivesse
pessoas que me passassem dicas ou me orientassem adequadamente, a trajetória
podia ser menos cansativa e mais animada, em determinados trechos...
Casa de Arabella - Se você fosse convidada
a dar uma aula sobre como escrever, como seria?
Leila - Eu sou sempre... Acho muito divertido.
E o pessoal
também. Já tive alunos "ilustres"
junto com "donas-de-casa" e
crianças, gosto de turmas heterogêneas.
Não há uma formula
para se dizer quem-deve-escrever-como-e-o-quê.
Acho que
importante, uma área como esta, é
mostrar que a criatividade
é um campo muito amplo e que tudo é
permitido. Feito mansinha de modelagem, em mãos hábeis. Só
que no caso da literatura, o comando é dado por outra mansinha modeladora:
a encefálica. (risos). Se, pela própria terminologia, imaginação
é magia, dá perfeitamente para a gente aprender e ensinar
um pouco de efeitos especiais...
Casa de Arabella - Qual o seu processo de criação?
Existe rotina?
Leila - Não. Na verdade escrevo quase
que dia e noite. Na há
rotina que resista a esta longa jornada de
trabalho... É preciso
mudar sempre para não cansar. Mas escrever
é sempre mergulhar no inusitado, no desconhecido, no novo, daí
dificilmente fatiga, a não ser quando é uma novela; mas aí,
sempre há mais gente escrevendo conosco. O bom de diversificar estilos
é que, quando estou prolixa, opto pela prosa; quando estou sintética,
pela poesia (risos).
Casa de Arabella - O que mudou do primeiro
trabalho, em 1965, até hoje?
Leila - Além da conscientização
profissional, a importância da
literatura em minha vida. Em 65 era só
hobby, hoje é meu modus vivendi.
Casa de Arabella - Foi a partir dele, que você
disse: "é isso, sou escritora!"?
Leila - Imagina... Meu primeiro livro é
"horrorível" (risos), embora, sem ele, não haveria outros.
No entanto, mesmo entendendo a sua importância, demorei muito para
assumi-lo
em minha vida. E do primeiro para o segundo
livro, o intervalo
é de onze anos (76). Eu nunca pensei
em adotar a literatura como profissão; mas... um dia sai do departamento
jurídico do Sindicato onde eu trabalhava e pedi um mês de
ferias aos meus colegas, com os quais eu ia montar um escritório.
Na minha cabeça, um mês era tempo suficiente para eu acabar
de escrever um livro que eu tinha começado, e que nunca acabava
por falta de tempo. Bem: foram as ferias mais longas de minha vida, pois
nunca mais voltei para a advocacia.
Casa de Arabella - Os ciclos de poesia estão
relacionados a momento diferentes em sua vida ou tem algum outro significado?
Leila - Os ciclos surgiram mais ou menos
recentemente, quando eu vi que havia muitos temas recorrentes na minha
poesia. O primeiro deles foi o "Ciclo Infantil", publicado no meu livro:
"Silencio Relativo" (77). Senti necessidade de nomear esta serie, para
que ela ficasse bem caracterizada. Depois disso, outras reuniões
foram surgindo, enfocando os assuntos mais presentes na minha obra. E vieram:
o ciclo ditaduras, o esotérico, o ecológico, o em poucas
palavras, etc. O mais recente é o ciclo micreiro (ou da Internet)...
Casa de Arabella - Quem são suas referências
literárias?
Leila - Os letristas da MPB... (Risos) Em
70 a gente ouvia muito mais musica do que lia livro, até porque
havia a tal da censura previa. Acho que minha poesia tem muito deste diálogo
coloquial. De qualquer maneira como sempre li muito podia citar dezenas
de poetas. Na verdade, gosto dos clássicos, dos românticos,
dos concretistas, da geração 45, dos tropicalistas, dos pós-modernistas...
Enfim: em matéria de música e de poesia eu sou bastante eclética.
Casa de Arabella - Que novos escritores você
indicaria?
Leila - Os novos. Com a editora, tenho o
privilegio de receber material de gente praticamente inédita
e de estar sempre em
contato com o que ainda nem foi publicado
neste pais, um material extremamente vivo, inquieto e forte. Há
poetas, contistas e ensaístas EXCEPCIONAIS. É um privilegio
lê-los e, mais ainda, ajudá-los a editar seus livros.
Casa de Arabella - O que é popular e
o que não é popular? Cultura de massa e cultura mais elitizada.
Leila - Popular dirigido ao "povo" ou popular
de popularidade?... Acho que o formato televisivo é feito para ser
popular com o povo (leia-se população). Ou o radio. Até
o cinema não é mais tão popular pelo preço
das entradas.
Casa de Arabella - Novela é popular,
teatro não, pagode sim, MPB não, etc. Para você, que
escreveu de um ao outro, o que muda?
Leila - Eu não faço esta diferença
quando escrevo, embora tenha consciência de que meu publico alvo
é a classe media, porque a pobre não lê (a maioria
é analfabeta), e a rica, tem outras ocupações, ou
mais "lucrativas" (economicamente falando) ou mais "colunáveis".
É a classe media a quem me dirijo, até porque ela é
a mais rica de contradições: abrange desde o casal que compra
livros a metro para "decorar" a casa até o internauta que faz vai
a um motel virtual para fazer sexo...
Casa de Arabella - O que há de verdade
sobre alienação e analfabetismo cultural no Brasil?
Leila - Bem, acho que uma sociologia responderia
esta pergunta melhor. Mas, do meu ponto de vista de cidadã, eu acho
que a alienação é gravíssima, porque independe
de alfabetização. Um analfabeto na certa é um alienado
até pela sua própria condição de não
saber ler ou escrever; mas tem muito doutor também alienado. Então,
enquanto o analfabetismo é facilmente detectado e, com um pouco
de esforço de todos, pode ser extinto ou bastante diminuído,
a alienação é mais difícil, pois depende de
mudanças radicais na estrutura sócio-econômico-politica
do país, o que não interessa `a microfísica do poder.
Casa de Arabella - Sobre o projeto SET, pode
falar um pouco sobre ele?
Leila - A idéia foi de Urhacy Faustino,
e ela surgiu dele ver a
minha batalha para conseguir filmar um roteiro
meu, adaptação do belo romance do Paulo Jacob, "Cassianã".
Fiquei onze anos com este projeto -- difícil pela linguagem e por
uma serie de entraves -- e, até hoje, ele jaz na gaveta. Bom, o
Prêmio Set seria uma loteria comum: daria os mesmos prêmios
que a sena ou qualquer outra loteria, só que a renda se reverteria
para a realização de 24 novos filmes nacionais, 12 longas
e 12 curta-metragens. Desses, um filme seria feito coletivamente pelos
formandos de universidades federais e estaduais de cinema e interpretação,
para promover um intercâmbio entre universitários, dando inclusive
oportunidade aos alunos de ingressarem no mercado, de imediato.
Casa de Arabella - O que falta para acontecer?
Leila - Assinatura do Ministro da Cultura.
Fernanda Torres, no
auditório de O Globo, ao ser inteirada
do Projeto, disse em público, para um auditório repleto,
que essa idéia era genial. Porém, todavia, entretanto, o
projeto está emperrado nas nos
gabinetes de Brasília.
Casa de Arabella - Por que a importância
de se dissociar, no projeto, o patrocínio de outras empresas? Justamente
para não se adequar ao mercado? Ao que é consumível?
Leila - Não dissociamos. Apenas desvinculamos
as verbas
privadas e publicas do projeto, até
porque elas, na prática, são difíceis de serem conseguidas.
Alem do mais, como proposta ideológica, é lindo ver as pessoas
voltadas para o cinema, ganhando triplamente com isto: em dinheiro, em
cultura, e tendo a alegria de patrocinar, apenas com a compra de um único
bilhete, o desenvolvimento de toda uma industria em ascensão.
Casa de Arabella - Da nova safra de filmes
nacionais, aposta em algum que leve o Brasil pela Quarta vez consecutiva
à disputa pelo Oscar?
Leila - Calma... não vamos nos precipitar,
ainda tem muito filme bom para aparecer até o ano que vem...
Casa de Arabella - A Vida é Bela ou
Central do Brasil?
Leila - É bela, mesmo com a Central
do Brasil... "Eu sei que a vida devia ser bem melhor e será'/ mas
isso não impede que eu repita:/ é bonita, é bonita
e é bonita"... Salve, Gonzaguinha!
Casa de Arabella - Por que gatos?
Leila - Por que filhos?
Casa de Arabella - Várias vezes eu li
depoimentos de escritores falando do modo como viam os escritores antes
de se tornar um, de modo geral, rodeado de mitos, como um ser especial
e no final, a surpresa de que são seres comuns. Para concluir: algo
sobre a
pessoa Leila Míccolis e mais algo para
quem está querendo apostar nessa profissão: ser escritor.
Leila - Cada ser é especial, porque
único; mas todos somos comuns, com as mesmas necessidades, carências,
sustos e surtos... Não importa se escritor, ator, pintor ou tecladista.
Acho que a Geração Poética de 70 desmitificou essa
postura do escritor como o todo poderoso senhor da sua torre de marfim.
Levamos poesia aos bares, às ruas, aos metrôs, às barcas,
às praças publicas, aos palcos, mostramos que as pessoas
que nos ouviam podiam (e muitas vezes eram) poetas sem saber, fizemos varais
e chuvas de poesia, vendemos nossos livros de mão-em-mão,
interferimos no processo de edição e distribuição
das nossas produções, e aprendemos muito com toda esta abrangência.
Acho que é isto que diria a quem quer ser escritor: não se
restrinja a apenas colocar no papel ou digitar no computador os seus textos.
Como Torquato Neto já dizia, "escrever é apenas a ponta de
um iceberg"; entenda, pelo menos um pouco, de todo o processo editorial,
uma arte à parte; ouse enveredar por vários caminhos literários,
mesmo que você se sinta a principio perdido; seja sempre sensível
a criticas construtivas, aprenda sempre com elas; e, principalmente, resista:
não desista nunca de seus sonhos. |